As irmãs Salete e Cecília Conceição trabalharam como bilheteiras no cinema histórico do município ribeirinho durante os anos 1960
Percorrendo as históricas ruas de Penedo, respiramos cultura e história a cada passo dado. Além das igrejas, prédios históricos e as belas águas do rio São Francisco, também é provável encontrar com duas senhorinhas que carregam em si tanto cinema que suas histórias são dignas do Oscar. As irmãs Salete e Cecília Conceição, conhecidas como dona Sassá e dona Cecé, atuaram como bilheteiras do Cine Penedo na década de 60 e, apesar de tanto tempo, elas contam suas memórias da época como se tivessem acontecido ontem.
“Ah, eu lembro de tudo. Lembro da escada que o público subia pra ir até a sala ver os filmes, do balcão sempre cheio, do pessoal que saía da igreja e esperava na porta do cinema pra pegar logo os ingressos. Foram tempos muito bons da minha vida”, relata dona Cecé, com um largo sorriso no rosto.
As irmãs contam que trabalhavam no Cine Penedo desde adolescentes, e a história começou quando ainda eram funcionárias em outros estabelecimentos pertencentes à família do proprietário do cinema na época. Sassá era costureira. Cecé era balconista em uma butique. Ambas relatam que, desde muito novas, já gostavam de assistir a filmes, esgueirando-se, em pequenas espiadas, nas sessões em cartaz da época, antes mesmo de se tornarem bilheteiras.
Segundo elas, a oportunidade surgiu primeiro para Cecé, que começou a trabalhar no Cine Penedo em meados da década de 60. Durante o dia, continuava como balconista na butique, já a noite ia para o lugar onde conta que viveu os grandes momentos de sua vida: o cinema.
“Tinha um monte de filme que eu nem tinha idade pra ver, porque eu comecei de bilheteira bem novinha, mas via escondido quando ninguém tava olhando. Algumas vezes, o dono do cinema me flagrava e dizia rindo ‘alguém fica de olho na Cecé, ela não pode ver isso não’. Era bom demais”, conta ela, visivelmente empolgada com as memórias.
De acordo com dona Sassá, todas as histórias que a irmã contava sobre o escurinho do cinema instigaram nela o desejo de também trabalhar com aquilo, e não demorou muito até a jovem Salete pedir ao dono do estabelecimento para ocupar uma função semelhante à da irmã. E assim foi feito: Sassá tornou-se bilheteira no Cine São Francisco, mas conta que, por muitas vezes, também trabalhava junto a Cecé no icônico Cine Penedo.
Quando questionadas sobre a época mais movimentada dos cinemas, as irmãs respondem juntas, sem pensar duas vezes: o Festival de Cinema Brasileiro de Penedo. Cecé relata que “os artistas do Brasil inteiro vinham aqui pra Penedo” e lembra com carinho especial da vinda do ator e cantor Ronnie Von à cidade ribeirinha.
“O evento era mais no cinema lá de baixo [Cine São Francisco], mas aconteceu no daqui de cima também [Cine Penedo]. Quando o Ronnie Von veio pra cá, ele só vivia andando com a gente. Lembro que todo mundo dizia ‘eita como eu queria ser a Sassá e a Cecé’, e a gente passava rindo”, relata dona Sassá, com um sorriso no rosto. As irmãs dizem que não lembram se trabalharam em todas as edições do festival, que durou de 1975 a 1982, mas que a cidade inteira vibrava quando chegava a época dessa celebração.
O fechamento do Cine Penedo, na década de 80, foi um baque para as duas irmãs. Quando questionadas a respeito, as duas respondem, quase em uníssono: “uma das maiores tristezas da vida”. Elas contam que, além de uma grande mudança de rotina, ver o cinema de portas fechadas as fazia lembrar com tristeza de todos os momentos felizes que viveram ali.
A tristeza de Sassá e Cecé perdurou por mais de 40 anos, até que em 2023, na 13ª edição do Circuito Penedo de Cinema, o Cine Penedo foi reaberto para exibições. Um largo sorriso se abre nos lábios das duas irmãs quando falam sobre a cerimônia de reabertura, momento para o qual as duas foram convidadas de honra. Elas falam sobre como tudo está diferente, mais moderno, mais novo, mas também sobre todas as memórias que vieram à tona quando sentaram ali novamente para assistir a um filme.
“Tá tudo tão diferente, mas também tão igual. As cadeiras, o telão, o escurinho e o frio na barriga quando apagam a luz. Vem tanta coisa na cabeça, que eu quase choro. Uma coisa é certa: se me pedirem pra ser bilheteira de novo, eu aceito”, afirma dona Sassá, com a maior das convicções.